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Intervenções

O lixo incomodava a todos, não era mais possível passar pela calçada estreita da Rua Camilo esquina com Rua Catão. O local foi designado “ponto viciado”, pois lá, carroceiros e vizinhos despejavam entulho e lixo.

Nos casos de “ponto viciado” a prefeitura costuma colocar uma placa, mas na maioria das vezes não funciona, pois levam a placa embora. Como resolver o problema? O que fazer? Tentei simular uma conversa com o poste colocando um cartaz, mas não funcionou.

Surge uma ideia! A Bete!

Durante a preparação de uma festa em casa, eu e meu amigo Beneson percorremos lojas da Lapa para comprar uma manequim com o intuito de criar uma cena singular na decoração do quintal. Bete foi encontrada no fundo de uma loja na Rua Doze de Outubro, estava suja e um pouco deteriorada, mas após pequenos reparos ficou linda.

Bete foi um sucesso durante a festa! Depois continuou habitando a casa, como se fosse um membro da família, todos a conheciam e a admiravam.

Bete apresentava todos os requisitos necessários para o cargo de guardiã da esquina: popularidade, simpatia e integridade.

Comecei a fazer propaganda pelo bairro, inclusive para o jornal local.

Bete, mulher íntegra e valente chegará para resolver o problema do lixo!

Era mês de abril, uma manhã de domingo e os vizinhos aguardavam a hora de carregar a Bete para seu local de trabalho. Tudo estava preparado! Havia uma placa com sua foto, muito parecida com as placas de segurança particular e também uma placa complementar explicativa pedindo colaboração. Todos queriam ajudar! Vizinhos trouxeram furadeira, parafusos, extensão e muita animação, mas o interesse das crianças estava voltado para a pintura do poste e da calçada. A Bete estava pronta, uniformizada, de forma a impor seriedade em seu trabalho. Havia uma alegria contagiante! Todos que passavam por ali interagiam, queriam tirar foto com a nova guardiã. Foram horas de trabalho minucioso, desenhos delicados no poste, na calçada e muita conversa. Foi um domingo de convivência, parceria, e encontros.

No dia 29 de outubro de 2012, comemoramos os 6 meses da eficiente atuação da Bete na esquina. Fizemos uma festa. O encontro foi celebrado com nuvens de algodão doce.

A querida Vila Romana ainda guarda essa vida pulsante.

Fotos: Acervo Pessoal

Bete a guardiã

Diante da agressiva ação da especulação imobiliária na Vila Romana, surgiu espontaneamente um movimento de moradores, o “MOVER” – Movimento de Oposição à Verticalização. Ele surgiu após as demolições da Fábrica Petybom e da Fábrica Melhoramentos.

A comunidade local ficou chocada e entristecida, pois as fábricas representavam e preservavam a história da região. A Vila Romana era um bairro fabril, dinâmico e dentro dessas fábricas a comunidade se reconhecia parte de um grande todo.

Conta uma moradora que a Fábrica Melhoramentos promovia bailes e piqueniques para seus funcionários, sendo assim é fácil entender que o valor afetivo por essas fábricas é incalculável!

Quarteirões inteiros, repletos de histórias, memórias e afetos transformados em torres sem identidade, sem beleza estética, sem medida, pois a altura do gabarito tão exagerada, não só não se adequa às casas ao redor, como também impede a presença do sol e a vista do céu.

Em meio a essa brusca e imposta transformação surge um grafiteiro anônimo que escreve nos tapumes das construções das torres a seguinte mensagem : + prédio?

Eu e toda a comunidade, claro, apreciamos a inteligente e acertada palavra. Com uma única palavra e dois sinais ele sintetizava o sentimento de todos.

Andávamos pelo bairro e em cada muro de área demolida, ou em tapumes de construções, encontrávamos a sábia mensagem: + prédio?

Foi então, que tive a ideia de dialogar com ele. Ele deixava sua mensagem em preto e eu em vermelho, ele com os sinais + ? eu - !

+ prédio?

- identidade!

Curiosamente, depois de 6 ou 7 meses, conversando com um primo, descobri que era ele que deixava as mensagens. Foi engraçado, isso mostra como a família possui raízes profundas e amorosas pela Vila Romana.

Histórias de resistência
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